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Uma viagem pela história de 'The Twilight Zone': seis décadas de ativismo social

A filha de Rod Serling desvenda o véu das questões por trás da icónica série!

Apresentado por: Mike Avila


Não faz muito sentido que, seis décadas desde que ‘The Twilight Zone’ entrou na consciência da cultura pop, ninguém teve a ideia de a exibir nos cinemas. No entanto, tal feito encontra-se a ser corrigido desde a semana passada, nos Estados Unidos, com uma seleção com curadoria especial de seis episódios da icónica série de televisão, juntamente com um novo documentário sobre Rod Serling.

Quando chegou a hora de escolher quais os episódios que fariam parte dessa apresentação especial dos 60 anos, Jodi Serling, filha de Rod Serling, disse que a escolha era fácil de fazer. «Bem, 'Walking Distance' ... foi o episódio favorito do meu pai"«, afirmou em declarações ao SYFY WIRE. "Quero dizer, havia apenas algumas partes dele, a lidar com a perda que teve porque nunca conheceu o seu pai, uma vez que não conseguiu ser libertado do Exército a tempo de ver o seu pai pela derradeira vez, antes de este falecer. Esta era história muito pessoal para ele…»

Serling acrescenta que ‘Walking Distance’ também é o seu episódio favorito, porque sempre que o vê, ela lembra-se do pai. "O meu pai apanhava boleia todos os verões na nossa casa no lago Cayuga, que fica em Ithaca, e passava uma hora em Binghamton, Nova Iorque, e revisitava a sua cidade natal", explica.

"Foi como a sua jornada particular de ver a sua antiga casa. Ainda está lá na Bennett Avenue, andando no carrossel, que não é o mesmo carrossel, e vagueando pelas ruas como ele fazia. Esse episódio é tão nostálgico [para mim], porque é muito sobre o meu pai, não posso deixar de o ver. Acho que para meu pai, quase todos os personagens de todos os episódios que ele escreveu eram como pedaços dele", continua. "[A série] apenas examinou a sua imaginação crescente e a sua generosidade avassaladora e, definitivamente, a sua busca pelo heroísmo e a sua inteligência irreprimível e, acima de tudo, o seu profundo senso de decência."

Grande parte do ímpeto da série veio das lutas e dos traumas pessoais de Rod Serling. Veterano da Segunda Guerra Mundial, que lutou no Pacífico, teve ataques difíceis com a síndrome do stress pós-traumático. «Acho que ele falou sobre isso através de alguns episódios de ‘Twilight Zone’ que lidavam com a guerra, mas sei que minha mãe o seu maior apoio e acho que ele conversou muito com ela sobre isso", diz Serling. "Quando abandonou a guerra, ele estava derreado e a única maneira de lidar com todo este stress era escrever sobre isso. Tal tornou-se catártico para ele. O meu pai tinha, definitivamente, pesadelos, segundo a minha mãe. Ele acordava suando, a pensar que ainda estava nas Filipinas, na selva. Ele viu muitas coisas horríveis durante a guerra. Mas, sempre que chegava a casa de rastos, ele fixava-se na escrita. Havia muita dor em muitas das histórias, muitos tópicos sobre solidão e perda, acrescenta. "Ele evocou temas de preconceito, amor e guerra, questões que, ainda hoje, estão latentes na nossa sociedade. Nesse sentido, ele abrangeu muitos assuntos que fizeram parte de tudo o que havia lidado ao longo da sua vida».

Outro episódio lendário é o 'Monsters Are Due on Maple Street', uma história sobre paranoia e o estado frágil das relações com os vizinhos. Serling ansiava sempre pela nostalgia de sua idílica educação americana e a cidade retratada naquele episódio foi modelada após o a pequena aldeia onde Serling foi criado. Tal como fez várias vezes durante a série, Serling desconstruiu a mística da nostalgia para explorar os aspetos mais sombrios da humanidade.

"Tudo o que ele escreveu foram pedaços de seu passado ou pedaços de seu presente, ou até premonições do que ele julgava poder acontecer no futuro", diz Serling.

Manter o controlo criativo de ‘The Twilight Zone’ significava manter um cronograma exaustivo. Serling, que morreu aos 50 anos em 1975 após uma cirurgia de coração aberto, foi o anfitrião, produtor e escritor do programa. A família sabia que, quando a porta do escritório estava fechada, ele estava ocupado criando magia televisiva. Foi também nessa altura que ele ditou os seus guiões para um gravador, uma visão que a sua filha recorda com muito carinho. "Lembro-me dele no Dictaphone, a acenar para nós como quem diz ‘estou ocupado agora’. Mas a atenção dele nunca foi curta. Isto é, ele sempre esteve presente para nós enquanto crianças. Ele era um ótimo pai."

Ter um pai de TV famoso deve ter tido suas vantagens, mas Serling diz que ela era jovem demais para realmente apreciá-lo. "Até hoje, ainda adoro ver meu pai na TV, mas acho que, enquanto criança, não conseguia partilhar a extensão da emoção. Lembro-me de perguntar ao meu pai sobre o programa, quando eu tinha 11 anos, e acho que suas explicações confundiram o meu cérebro de 11 anos. Ele descreveu os episódios como se fossem seus contos de fadas adultos. Uma vez, perguntei se havia animais na série e ele disse-me que eu estava a bater na porta errada, mas lá me contou que o programa era sobre que os mistérios da vida que eu nunca aprenderia na escola. E, para mim, isso soou vagamente rebelde e fixe.”

Além do impacto contínuo de ‘The Twilight Zone’, que foi recentemente reiniciado por Jordan Peele numa nova série, Jodi Serling quer garantir que algo pelo qual o seu pai era apaixonado não seja esquecido: a sua dedicação ao ativismo social.

"O meu pai era incrivelmente apaixonado e queria salvar a sociedade. Em 1968, quando o país estava tumultuado com os direitos civis e com os movimentos anti-guerra, ele discursou na Biblioteca do Congresso, em Washington. Ainda hoje, guardo uma citação que ele afirmou: 'Enquanto homens e mulheres escreverem o que eles quiserem, então todas as outras liberdades permanecerão intactas. E é então que a escrita se torna num ato de consciência, numa arma da verdade e num artigo de fé. Ele sempre esteve muito envolvido em direitos civis:  marchou com Martin Luther King Jr. e frequentou a escola com Coretta Scott King em Antioquia; a minha mãe e ele conheciam muito bem a sua esposa. O meu pai achava que o dever do rádio, da televisão e do cinema era ser o veículo de críticas sociais e que os escritores deveriam representar a consciência pública. Ele também achava criminoso não podermos fazer anotações dramáticas dos males sociais que existem em nossa sociedade.

Desta forma, ele utilizava a ficção científica com frequência, como porta de entrada para obter coisas do outro lado, quando encontrava resistência dos patrocinadores. Ele sabia que, desde que usasse extraterrestres, poderia safar-se porque os patrocinadores não sabiam bem o que ele estava realmente fazer e qual a mensagem estava a tentar retratar. "

Antes da nossa conversa terminar, perguntamos a Jodi Serling uma pergunta que sempre nos perguntamos: será que Rod Serling daria uma volta na Tower of Terror?

Não percas os novos episódios de ‘The Twilight Zone’, todas as terças, às 22:15H, no SYFY!


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